Monday, April 23, 2007


Aqui vou eu para a Costa, aqui vou eu cheio de pica, de Lisboa vou fugir, vou para o sol da Caparica...
A minha tarde de ontem, passada na praia da Cabana do Pescador, na Costa da Caparica e na companhia do costume, fez-me evocar uma crónica do grande MEC, intitulada
«O Factor SPAC»
A amizade, entre um homem e uma mulher é (o leitor que escolha) um bico de obra; uma coisa muito linda; ainda mais complicado que o amor; absolutamente impossível; amizade da parte da mulher e amizade da parte do homem; só possível se a mulher for forte e feia; impossível se o homem for minimamente atraente; receita certa para a desgraça; prelúdio certo para o romance; indescritível; inenarrável; o que deus quiser ; o diabo.
O leitor que não tenha escolhido todas as hipóteses não percebe nada disto.
Quanto á leitora, o mais provável é ter ficado a pensar «só», já que as mulheres portuguesas, por dura experiência, percebem mais certas coisas que os homens.
Em Portugal, a amizade entre pessoas de sexos opostos (ou sexualidades opostas) é sempre muito problemática, dada a chamada «cultura vigente». Esta cultura é denominada pelo conhecido Factor SPAC. Este (que significa, em repreensível português, «Salto para a Cueca» está sempre presente.
E ela interroga-se: «Se calhar este também me quer saltar para a Cueca?» E se calhar quer. Se isto é ou não um crime, é o que se vai ver.
O homem português tende a distinguir mais claramente entre Amigos e Amigas. Os amigos são para copos e conversas escandalosas de bola e de «boas». E são também, nos casos extremos, para Sempre.
As amigas são para as chávenas de chá e conversas profundas sobre a natureza do Inverno, ou dos signos do Zodíaco. Isto sem falar nos típicos carameis para quem as «amigas» são todas as pessoas do sexo oposto com número de telefone, olhos bonitos e uma possibilidade mínima de 1% na tabela SPAC.
Uma das maneiras tradicionais de atenuar o factor SPAC é S mesmo PAC.
«Pronto, agora que já estamos despachados neste departamento, - diz a mulher para o homem, atirando-lhe o maço de cigarros [está bem, pronto, de SGPack], - vamos lá a ver se ficamos amigos».
Tal como o homem pensa «Que chatice! Isto nunca mais passa da amizade para o que interessa!», a mulher pergunta «Será que ele é mesmo meu amigo ou estará só a fazer-se ao piso?» está a cometer o mesmo erro. É como perguntar acerca de um pastel de nata se é mesmo feito de farinha ou só de nata. Portugal não é só Lisboa, mas Lisboa também é Portugal (e não é pouco).
(…) então os homens só podiam ter amigas muito feias (o que é limitativo) e as mulheres só podiam ter amigos muito desinteressados (o que seria muito desinteressante). A própria ideia de uma amizade «inocente» põe a hipótese de uma amizade «culpada». Ora ninguém pode ter culpa de ser amigo de outra pessoa. A verdade é outra.
Como as mulheres são diferentes dos homens (por exemplo, os segundos sentem-se mais obrigados a tentar SPAC das primeiras do que as primeiras PAC dos segundos), é natural que essa diferença se fala sentir nas relações de amizade. Quando não existe a mínima atracção de parte a parte, tudo bem. Mas quando existe, também não é mau. Aliás, se houver uma gestão elegante dos vários frissons envolvidos, pode até ser melhor.
Por outro lado, as mulheres, regra geral, tornam-se amigas dos homens pondo a raridade e o valor da amizade acima da maior vulgaridade do SPAC.
Tanto mais que o homem português não põe facilmente a hipótese de uma mulher se tornar amiga dele para lhe SPAC. O raciocínio típico Homo Lusitanus é simples: «Oh se ela me quisesse SPAC escusava de estar com tanto trabalho!» Em Portugal é assim. O homem acha que, no que toca a SPAC, é ele quem tem de trabalhar.
A verdade é que o amigo talvez gostasse de lhe SPAC, não lhe cairia mal, não senhor, mas pronto, se não puder ser ninguém morre por causa disso, ficamos amigos á mesma.
Resumindo: para as mulheres, como amigas de homens, é «amizade, amizade, amores à parte», enquanto para os homens é mais «amizade, amizade, e uns amores à parte, se puder ser, se faz favor, senão também não faz mal.»
Na verdade, a amizade e o factor SPAC não são mutuamente exclusivos. Pode ser-se muítissimo amigo de alguém que se deseje muito, pouco, muito pouco ou nada.
O factor SPAC tem o mesmo peso na amizade que o MAX Factor no amor. Nem mais.
Miguel Esteves Cardoso, in “os meus problemas” adaptado.
- All These Things That I've Done, The Killers

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